sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Abaixo a nossa história (2)

Vale tudo em prol do progresso? Nem tudo. Certamente não vale a destruição de um patrimônio histórico-cultural. No Brasil, claro, isso não é seguido. Em termos de história e preservação de nossa memória, somos   péssimo exemplo. Aqui, infelizmente, algo antigo é considerado velho e por ser velho pode ser descartado. Pouquíssimo, quase nada, na verdade, é preservado, principalmente quando o assunto é o conjunto arquitetônico.

Antes de mais nada, devo dizer que sou fã do progresso e estou ciente de que uma cidade precisa de espaço para crescer e intervenções urbanísticas são necessárias em prol do seu bom desenvolvimento. De tempos em tempos essas intervenções acontecem, como foi o caso do começo do século XX (período bem retratado na novela das seis da Rede Globo)  em que o então prefeito Pereira Passos abriu a Avenida Central (hoje Avenida Rio Branco), entre outras intervenções, precisando, para tanto, derrubar muitos cortiços e outros prédios mais antigos. O resultado disso foi, além de uma avenida larga que prometia melhorar o crescente fluxo de pessoas e veículos pelo centro da cidade, o surgimento da primeira favela da cidade, no Morro da Providência. O resto é história. 
  
Outras intervenções ocorreram ao longo do século XX, como a derrubada do morro do Castelo (que prometia melhorar a corrente de ar no centro da cidade, mas "curiosamente" em seu lugar foram erguidos prédios bem mais altos!), a abertura da Avenida Presidente Vargas, a construção do Estádio do Maracanã, o aterro do Flamengo, e até mesmo o (já tardio) metrô, que já no final da década de 1970 precisou desalojar famílias de suas casas que ficavam no traçado da linha subterrânea. A maior vítima desse progresso foi o Palácio Monroe, que ficava na Cinelândia, em frente ao Theatro Municipal e completava o conjunto arquitetônico parisiense com que Pereira Passos tanto sonhava para deixar a cidade com ares da capital francesa. Campanhas difamatórias regidas pela mídia em nome do tal progresso determinaram a demolição do imóvel, sendo que a linha do metrô nem passaria por debaixo dele.

Palácio Monroe. Criminosos o derrubaram.

Algo semelhante está prestes a acontecer. Com a intervenção no complexo do Maracanã para a Copa do Mundo de futebol de 2014 e as Olimpíadas e Paralimpíadas de 2016, um antigo casarão que foi a primeira sede do Museu do Índio, fundada por Darcy Ribeiro, está prestes ao ir ao chão. O prédio centenário, em ruínas já há décadas por conta do descaso do poder público, é hoje habitado por 60 índios de diversas etnias, que lá construíram moradias e até uma oca no terreno. O governo do estado do Rio de Janeiro, alegando seguir orientações da FIFA (que já as negou) para maior mobilidade do público, decidiu vender o imóvel ao consórcio que administrará o complexo no futuro e vai demoli-lo, sem dó nem piedade. O interessante disso tudo é que no local será erguido o que promete ser o museu do futebol, restaurantes e lojas. Ora bolas, e tal mobilidade?! Por que afinal o prédio não pode ser preservado e restaurado e lá ser construido o tal museu  ou o tal restaurante? Lembram da história do morro do Castelo? Pois é...

O antigo museu do ínido. Ruinas...
Como bom empresário que é (sim, empresário!), e primadona que só ele, o (des)governador Sérgio Cabral, mesmo sendo agora pressionado pela opinião pública e até pela defensoria pública da cidade do Rio de Janeiro e também pelo IPHAN bateu o pé: vai demolir mais um pedaço de nossa história. Resta saber que interesses tem esse senhor com a venda do terreno e a demolição do prédio. Mais uma vez, ele perde a oportunidade de sair por cima. Lamentável.

Curiosamente, um prédio que é sinônimo de péssima arquitetura, para não falar de muito mal gosto também, está sendo sondado para integrar o circuito de preservação da memória da cidade. Estou falando do Edifício Avenida Central, na Rio Branco (antiga Av. Central, no Rio de Janeiro). Como pode ser possível ele ter maior valor histórico do que um casarão neoclássico posto abaixo?

Ed. Av. Central. Exemplo da pior arquitetura que existe.




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2 comentários:

  1. O museu não será destruído em vão. Ele permitira que o maracanã cumpra todas as exigências que a Fifa exige para a Copa. E isso trará benefícios para todos.

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    1. A FIFA desmentiu o fato de que exigiu a demolição do prédio. Em todo o caso, em seu local será construído outro prédio que abrigará o museu do futebol. Então, onde está a vantagem? Nenhum prédio histórico deveria vir abaixo por conta de uma exigência da FIFA, qualquer que ela fosse.

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